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Agora é Crime: Brasil Avança na Proteção Animal com Leis que Proíbem Acorrentamento de Cães e Gatos

Agora é Crime: Brasil Avança na Proteção Animal com Leis que Proíbem Acorrentamento de Cães e Gatos

 

Uma mudança histórica está transformando a realidade de milhares de animais domésticos no Brasil. Nos últimos meses, estados como São Paulo e Minas Gerais sancionaram leis que criminalizam ou penalizam severamente o acorrentamento de cães e gatos, enquanto um projeto de lei federal tramita no Congresso Nacional para estender essa proteção a todo o território nacional. A medida representa um marco na luta pelos direitos dos animais e promete revolucionar a forma como a sociedade brasileira trata seus companheiros de quatro patas.

A mais recente conquista veio no último domingo, 25 de agosto, quando o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), sancionou a lei que proíbe o acorrentamento de cães e gatos em todo o estado paulista [1]. A legislação, originada de um projeto do deputado estadual Rafael Saraiva (União Brasil), estabelece definições claras sobre o que constitui acorrentamento e alojamentos inadequados, além de prever exceções específicas para situações emergenciais.

 

São Paulo Lidera o Movimento Nacional

A lei paulista define acorrentamento como “o meio de restringir a liberdade do animal, utilizando-se correntes, cordas ou similares, impedindo-o de se movimentar livremente no espaço em que se encontra” [1]. Já os alojamentos inadequados são caracterizados como “qualquer espaço que ofereça risco à vida ou à saúde do animal, ou que não atenda às dimensões adequadas ao seu tamanho e porte, ou que desrespeite as normas e condições de bem-estar animal” [1].

A legislação permite apenas o uso temporário de correntes em situações de impossibilidade momentânea de outro tipo de contenção, desde que o animal tenha condições adequadas de abrigo, água limpa, alimentação, higiene e mobilidade mínima [1]. O uso de enforcadores de qualquer tipo está completamente proibido.

Para o deputado Rafael Saraiva, autor do projeto, a sanção da lei representa o fim de anos de sofrimento animal. “Foram anos vendo animais com feridas no pescoço, condenados à solidão de uma corrente curta. Hoje, como ativista e deputado, sinto que cada um deles foi finalmente ouvido. Esta lei é um marco para a causa animal e uma esperança para todos que dedicam suas vidas a essa luta. Ninguém nasce para viver acorrentado”, declarou o parlamentar [1].

 

Minas Gerais:

Multas Pesadas Como Deterrente

Minas Gerais saiu na frente e já colhe os frutos de sua legislação pioneira. Em abril deste ano, o governador Romeu Zema (Novo) sancionou a Lei 25.201/2025, que estabelece multas superiores a R$ 5 mil para quem mantiver animais acorrentados de forma rotineira [2]. A norma, originada do Projeto de Lei 2.189/20, proposto pelo deputado Noraldino Júnior (PSB), foi aprovada pela Assembleia Legislativa mineira em março e entrou em vigor imediatamente.

A lei mineira é particularmente rigorosa: se a prática de acorrentamento resultar na morte do animal, a multa pode ultrapassar os R$ 5 mil iniciais [2]. O texto legal fundamenta-se no conceito das cinco liberdades animais, argumentando que animais submetidos a acorrentamento sofrem violações em pelo menos uma dessas liberdades fundamentais: deixam de ser livres, passam fome e sede, têm desconforto e dor, não podem expressar seu comportamento natural e sofrem medo e estresse [2].

A advogada e ativista pela causa animal Val Consolação celebrou a sanção da lei mineira, destacando a realidade preocupante do estado. “Infelizmente, em Minas Gerais, a prática de acorrentamento é comum. Animais chegam a ficar a vida inteira dessa maneira, e muitas vezes sem acesso a comida, água e mobilidade. O ativismo animal está feliz com a nova lei e vamos cobrar para que seja cumprida. Todo mundo precisa saber que agora é possível denunciar quando situações do tipo forem flagradas”, afirmou [2].

 

Projeto Federal Promete Criminalização Nacional

Enquanto estados avançam com suas legislações próprias, o Congresso Nacional debate uma proposta que pode estender a proteção a todo o território brasileiro. O Projeto de Lei 3077/24, de autoria do deputado Delegado Matheus Laiola (União-PR), foi aprovado pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados em dezembro de 2024 e aguarda análise da Comissão de Constituição e Justiça [3].

O projeto federal vai além das legislações estaduais ao propor alteração na Lei de Crimes Ambientais (9.605/1998), equiparando o acorrentamento permanente de animais ao crime de maus-tratos. A proposta prevê pena de três meses a um ano de detenção, além de multa, para quem mantiver animais silvestres, domésticos ou domesticados presos permanentemente com correntes, cordas ou objetos similares que prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar do animal [3].

O relator do projeto na comissão, deputado Bruno Ganem (Pode-SP), endossou a proposta do colega. “É inegável que a restrição severa dos movimentos de um animal por meio de correntes ou cordas pode causar sofrimento físico e psicológico”, declarou o parlamentar [3]. Para Laiola, autor da proposta, o acorrentamento representa um risco adicional em situações de emergência. “O acorrentamento pode aumentar o risco de morte dos animais em situações de emergência, como desastres naturais, incêndios e acidentes”, argumentou [3].

 

Os Traumas Invisíveis:

Impactos Psicológicos do Acorrentamento

Por trás das correntes e cordas que restringem fisicamente os animais, existe uma realidade ainda mais cruel: os traumas psicológicos que podem perdurar por toda a vida do animal, mesmo após o resgate. A veterinária Monique Rodrigues, CEO e fundadora da franquia Clinicão, explica que os efeitos dos maus-tratos vão muito além das lesões visíveis.

“Assim como acontece com os humanos, os animais também podem sofrer emocionalmente e demonstrar mudanças no comportamento pós-trauma”, afirma a especialista [4]. Segundo Rodrigues, os sintomas podem incluir medo intenso e ansiedade, comportamentos mais agressivos ou defensivos, isolamento social, problemas na saúde mental e física, além de comportamentos destrutivos e autodestrutivos, como arrancar ou mastigar os próprios pelos, lamber-se excessivamente e, em casos graves, ferir-se deliberadamente [4].

Um dos aspectos mais preocupantes identificados pela veterinária é a perda de confiança na relação com os humanos. “Outro exemplo notório é a falta de confiança na relação com os humanos”, destaca [4]. Essa ruptura do vínculo pode tornar extremamente difícil a reabilitação e readaptação do animal, mesmo em lares amorosos.

Os impactos não se limitam ao aspecto emocional. “Com o estresse prolongado causado por maus-tratos, há chance de afetar o sistema imunológico, tornando-os mais suscetíveis a doenças e infecções”, alerta Rodrigues. “Em casos mais extremos, negligência, falta de cuidados médicos e exposição a condições inadequadas podem levar, inclusive, à morte”, conclui a especialista [4].

 

Números Revelam a Dimensão do Problema

Os dados oficiais de Minas Gerais oferecem uma perspectiva sobre a dimensão do problema dos maus-tratos animais no país. Segundo o Observatório de Segurança Pública da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública mineira, 356 pessoas foram encaminhadas à delegacia sob suspeita de maus-tratos a animais em 2024, representando uma redução de 23% em relação ao ano anterior, quando 464 indivíduos foram detidos [2].

Apesar da redução, os números permanecem alarmantes. Apenas no mês de janeiro de 2025, 37 pessoas foram registradas por essa prática em Minas Gerais [2]. Os dados sugerem que, embora possa haver uma tendência de queda nas ocorrências formais, o problema ainda afeta centenas de animais mensalmente apenas em um estado.

 

Fonte: Observatório de Segurança Pública - Secretaria de Justiça e Segurança Pública de MG

 

Como Denunciar:

Canais Disponíveis para a População

Com as novas legislações em vigor, torna-se fundamental que a população conheça os canais adequados para denunciar casos de maus-tratos e acorrentamento de animais. Em Minas Gerais, onde a lei já está em pleno funcionamento, as autoridades disponibilizam múltiplas formas de denúncia:

• Disque-Denúncia: 181 (disponível 24 horas)

• Presencialmente: Qualquer Delegacia da Polícia Civil

• Delegacia Especializada: Delegacia Especializada de Investigação de Crimes Contra a Fauna (Rua Bernardo Guimarães, 1.571, 2º andar, Lourdes, Belo Horizonte) [2]

A Polícia Civil mineira desenvolveu a campanha “Abril Laranja” para conscientizar a população sobre as práticas consideradas maus-tratos e passíveis de prisão, multa e proibição da guarda. Entre as condutas que podem ser denunciadas estão atos de abuso, alimentação deficiente, abandono, envenenamento, má higienização, ausência de cuidados veterinários necessários, ausência de local adequado para viver, agressão física e mutilações para fins estéticos [2].

 

O Movimento Nacional Ganha Força

O avanço das legislações estaduais e federal reflete uma mudança cultural significativa na sociedade brasileira em relação aos direitos dos animais. Organizações não governamentais, como a “Os Animais Importam”, que mantém o projeto específico “Acorrentados Animais” dedicado à libertação de vidas presas em correntes, têm desempenhado papel fundamental na conscientização e pressão por mudanças legislativas.

A mobilização social em torno da causa animal tem se intensificado nos últimos anos, com ativistas, veterinários, ONGs e milhares de cidadãos comuns unindo forças para denunciar situações de maus-tratos e pressionar por mudanças legais. Essa articulação tem resultado não apenas em novas leis, mas também em maior conscientização sobre o bem-estar animal e a responsabilidade dos tutores.

 

Adoção Consciente:

A Prevenção Como Melhor Solução

Paralelamente às mudanças legislativas, especialistas enfatizam a importância da adoção consciente como forma de prevenir situações de maus-tratos. As autoridades mineiras estabeleceram diretrizes claras para quem deseja adotar um animal, incluindo a necessidade de disposição para cuidar da saúde do pet, tempo para carinho e atenção (incluindo passeios e brincadeiras), conhecimento sobre a espécie e suas especificidades, além de um ambiente preparado, arejado, coberto e seguro [2].

Essa abordagem preventiva reconhece que muitos casos de maus-tratos resultam não necessariamente de crueldade intencional, mas de despreparo, falta de conhecimento ou recursos inadequados por parte dos tutores. A educação e conscientização da população sobre as necessidades básicas dos animais domésticos tornam-se, portanto, complementares às medidas punitivas.

 

Perspectivas Futuras:

Um Brasil Mais Humano

As recentes mudanças legislativas representam apenas o início de uma transformação mais ampla na relação entre humanos e animais no Brasil. Com São Paulo e Minas Gerais liderando o movimento e o projeto federal em tramitação, é provável que outros estados sigam o exemplo, criando um mosaico de proteções que pode culminar em uma legislação nacional unificada.

O deputado Rafael Saraiva, ao celebrar a sanção da lei paulista, resumiu o sentimento de milhares de ativistas e defensores dos direitos animais: “São Paulo dá um passo histórico ao garantir que cães e gatos tenham uma vida de liberdade e respeito, fruto da mobilização de protetores, ONGs e milhares de pessoas que não aceitam mais ver animais sofrendo” [1].

A expectativa é que essas mudanças legislativas não apenas reduzam o sofrimento animal, mas também contribuam para uma sociedade mais empática e consciente sobre a importância do bem-estar de todas as formas de vida. Para os milhares de animais que ainda vivem acorrentados pelo país, essas leis representam a esperança de uma vida digna, livre das correntes que por tanto tempo limitaram não apenas seus movimentos, mas também suas chances de felicidade.

O caminho ainda é longo, mas os primeiros passos já foram dados. Com a aprovação do projeto federal, o Brasil pode se tornar referência mundial na proteção legal contra o acorrentamento de animais domésticos, consolidando uma mudança de paradigma que reconhece os animais não como objetos, mas como seres sencientes merecedores de respeito, cuidado e liberdade.

 
Referências
[1] G1 São Paulo. “Tarcísio sanciona lei que proíbe manter animais em correntes em SP”. Disponível em: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2025/08/25/tarcisio-sanciona-lei-que-proibe-manter-animais-em-correntes-em-sp.ghtml
 
[2] G1 Minas Gerais. “Lei impõe multa de R$ 5 mil para quem mantiver animal acorrentado”. Disponível em: https://g1.globo.com/mg/minas-gerais/noticia/2025/04/09/nova-lei-multa-5-mil-animal-acorrentado-mg-entenda.ghtml
 
[3] Câmara dos Deputados. “Comissão aprova proposta que prevê prisão por manter animal permanentemente preso em corrente”. Disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/1125937-comissao-aprova-proposta-que-preve-prisao-por-manter-animal-permanentemente-preso-em-corrente/
 
[4] Correio Braziliense. “Crueldade animal pode deixar traumas físicos e emocionais nos bichinhos”. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/revista-do-correio/2024/04/6839886-crueldade-animal-pode-deixar-traumas-fisicos-e-emocionais-nos-bichinhos.html
 

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